Palavras do Papa Leão XIV no início de seu serviço como Sucessor de Pedro. Escolhido sem mérito algum, mas desejoso de servir a Igreja amando

INestes últimos dias, vivemos um momento particularmente intenso. A morte do Papa Francisco encheu nossos corações de tristeza e, naquelas horas difíceis, nos sentimos como aquelas multidões das quais o Evangelho diz que eram "como ovelhas sem pastor" (Mt 9). No dia de Páscoa, porém, recebemos sua bênção final e, à luz da Ressurreição, enfrentamos este momento com a certeza de que o Senhor nunca abandona o seu povo, ele o reúne quando está disperso e "o guarda como um pastor cuida do seu rebanho" (Jr 36).

Neste espírito de fé, o Colégio Cardinalício reuniu-se para o Conclave; vindos de diferentes histórias e trajetórias, colocamos nas mãos de Deus o desejo de eleger o novo sucessor de Pedro, o Bispo de Roma, um pastor capaz de guardar a rica herança da fé cristã e, ao mesmo tempo, de olhar para o futuro, para responder às questões, preocupações e desafios de hoje. Acompanhados pela vossa oração, sentimos a obra do Espírito Santo, que soube afinar os diferentes instrumentos musicais, fazendo vibrar as cordas dos nossos corações numa única melodia.

Fui escolhido sem nenhum mérito e, com temor e tremor, venho a vocês como um irmão que quer ser servo da sua fé e da sua alegria, caminhando com vocês no caminho do amor de Deus, que nos quer todos unidos em uma só família.

Amor e unidade: estas são as duas dimensões da missão confiada a Pedro por Jesus. A passagem do Evangelho nos diz isso, levando-nos ao lago de Tiberíades, o mesmo lugar onde Jesus iniciou a missão recebida do Pai: “pescar” a humanidade para salvá-la das águas do mal e da morte. Passando pela margem daquele lago, chamou Pedro e os outros primeiros discípulos a serem como ele “pescadores de homens”.

Como Pedro pode realizar essa tarefa? O Evangelho nos diz que isso só é possível porque ele experimentou em sua própria vida o amor infinito e incondicional de Deus, mesmo na hora do fracasso e da negação. Por isso, quando Jesus se dirige a Pedro, o Evangelho usa o verbo grego ágape, que se refere ao amor que Deus tem por nós. Quando Jesus pergunta a Pedro: "Simão, filho de João, tu me amas?" (Jo 21,16), ele está, portanto, se referindo ao amor do Pai. É como se Jesus lhe dissesse: somente se você tiver conhecido e experimentado este amor de Deus, que nunca falha, você poderá apascentar os meus cordeiros; somente no amor de Deus Pai você poderá amar os seus irmãos com algo "mais", isto é, oferecendo a sua vida pelos seus irmãos. Pedro, portanto, é encarregado da tarefa de "amar mais" e de dar a sua vida pelo rebanho.

O ministério de Pedro é marcado precisamente por esse amor abnegado, porque a Igreja de Roma preside na caridade e sua verdadeira autoridade é a caridade de Cristo. Nunca se trata de capturar os outros por meio da opressão, da propaganda religiosa ou dos meios do poder, mas é sempre e somente uma questão de amar como Jesus amou. Ele – afirma o próprio apóstolo Pedro – "é a pedra que vocês, os construtores, rejeitaram e que se tornou a pedra angular" (Atos 4,11:1). E se a rocha é Cristo, Pedro deve pastorear o rebanho sem jamais ceder à tentação de ser um líder solitário ou um chefe colocado acima dos outros, fazendo-se senhor do povo que lhe foi confiado (cf. 5Pe 3:1); Pelo contrário, ele é chamado a servir a fé dos seus irmãos, caminhando com eles: de fato, todos somos constituídos "pedras vivas" (2Pe 5), chamados com o nosso Batismo a construir o edifício de Deus na comunhão fraterna, na harmonia do Espírito, na coexistência das diversidades. Como afirma Santo Agostinho: "A Igreja é constituída por todos aqueles que estão em harmonia com os seus irmãos e que amam o próximo" (Discurso
Eu sei 359, 9).

Irmãos e irmãs, eu gostaria que este fosse o nosso primeiro grande desejo: uma Igreja unida, sinal de unidade e comunhão, que se torne fermento para um mundo reconciliado. Em nosso tempo, ainda vemos demasiadas discórdias, demasiadas feridas causadas pelo ódio, pela violência, pelo preconceito, pelo medo dos diferentes, por um paradigma econômico que explora os recursos da Terra e marginaliza os mais pobres. E queremos ser, dentro desta massa, um pequeno fermento de unidade, de comunhão, de fraternidade. Queremos dizer ao mundo, com humildade e alegria: olhai para Cristo! Aproximai-vos d’Ele! Acolhei a sua Palavra que ilumina e consola! Escutai a sua proposta de amor para nos tornarmos a sua única família: no único Cristo somos um.

Este é o espírito missionário que deve nos animar, sem nos fecharmos em nosso pequeno grupo nem nos sentirmos superiores ao mundo; somos chamados a oferecer a todos o amor de Deus, para que se alcance a unidade que não anula as diferenças, mas valoriza a história pessoal de cada um e a cultura social e religiosa de cada povo.

Irmãos, irmãs, esta é a hora do amor! A caridade de Deus, que nos torna irmãos entre nós, é o coração do Evangelho e, com o meu predecessor Leão XIII, hoje podemos nos perguntar: se este critério "prevalecesse no mundo, não cessariam imediatamente todas as dissensões e a paz não retornaria?" (Carta Encíclica Coisas novas,

Com a luz e a força do Espírito Santo, construamos uma Igreja fundada no amor de Deus e sinal de unidade, uma Igreja missionária que abre os braços ao mundo, que anuncia a Palavra, que se deixa perturbar pela história e que se torna fermento de harmonia para a humanidade.

Juntos, como um só povo, como todos irmãos, caminhemos em direção a Deus e amemos uns aos outros.